Acabando 2400 anos de mal-entendidos

Ao que parece, o senhor Aristóteles, que viveu entre 383 e 322 antes de Cristo, defendia que as plantas – e no fundo tudo o que envolve o mundo vegetal, incluindo a Terra - estão mais próximas do mundo inorgânico, do que do mundo dos seres vivos.

Antes que os químicos me venham questionar sobre isto, para Aristóteles o mundo inorgânico não era o mundo dos compostos inorgânicos.

Nota: Para quem não sabe, os compostos inorgânicos na química são todas as coisas do nosso mundo, que não têm carbono na sua composição. Portanto, se Aristóteles fosse um químico, nunca iria dizer tal disparate, visto que o carbono faz parte da composição das plantas, de muitas formas diferentes!

Para Aristóteles, o mundo inorgânico era simplesmente tudo o que não se movia, ou seja, tudo o que não era capaz de se deslocar de um lugar para o outro.

Como consequência, tudo o que não se deslocava, também não tinha alma (e a alma para ele, também não era no sentido espiritual da coisa… era apenas movimento).

Estas ideias ficaram tão vinculadas na nossa sociedade, que fez com que nós associássemos as plantas a “coisas” - mais comparáveis a um pedaço de esferovite, do que ao mundo dos seres vivos.

No entanto, ele também defendia que as ideias surgem da observação de objetos!!

Já viram a contradição?!

A conclusão a que eu chego é que este senhor claramente tinha problemas de visão ou um sentido de observação extremamente limitado. Ou então, não passava tempo nenhum com plantas ou com árvores. Se passasse, iria certamente observar que de facto, as plantas e as árvores movem-se – constantemente (e não, não é por causa do vento).

Outro ponto que ele defendia era que “o problema fundamental é o problema do ser, não o problema da vida”. Resumindo por palavras mais simpáticas, isto significa que, ele acreditava que o problema era das pessoas, não da vida em si.

E com isto, ele dá-nos a resposta que já suspeitávamos! O senhor Aristóteles, sem se aperceber, admitia que estava absolutamente errado sobre as plantas e ainda nos diz porquê: se o problema é do ser, o problema é de quem as observou e não na própria vida, que neste caso são as plantas.

Afinal as plantas e as árvores estavam a viver a sua vida normalmente, quando foram julgadas em plena luz do sol.

Agora, a minha pergunta é, como é que é possível, que mesmo depois de vermos que o discurso deste homem está cheio de contradições e depois de termos provado o contrário diversas vezes ao longo da história – 2400 anos depois, ainda acreditamos nisto?

Durante todos estes anos, provámos e voltámos a provar a inteligência das plantas vezes e vezes sem conta (até Charles e Francis Darwin defenderem isto e reuniram as provas) e mesmo assim, parece que não queremos acreditar.

Mas como pode um ser que não se desloca na horizontal, ser inteligente?

Se fosse inteligente, não fugia com aproximação de um potencial perigo?

Como é que algo inteligente deixaria que lhe “roubassem” o que era dele e lhe cortassem partes do corpo, sem fazer nada que se visse?

Ora meus caros, a resposta é simples: uma vez mais, o problema está no ser (em nós) - mais propriamente no significado que nós atribuímos à palavra “inteligência”.

  • Inteligente não é aquele que evita o perigo, mas antes aquele que enfrenta os desafios da vida .
  • Inteligente, é o ser que partilha e evolui com o mundo beneficiando tanto o todo, como a si próprio.
  • A inteligência, vem da capacidade de viver e de sentir, não vem do medo de estar vivo.
  • Inteligente é aquele que escolhe viver de forma sustentável, por si próprio e pelo mundo que o rodeia.

Mas se a nossa definição de inteligência fosse atualizada de acordo com estes pontos, nós não estaríamos de todo incluídos na lista – e isso, é que não se pode aceitar!

E por outro lado, levanta algumas inseguranças legítimas sobre o modo como vivemos a nossa vida: afinal, como nos protegemos se não fugirmos? Como nos protegemos, se não controlármos o máximo possível? Será seguro viver sem medos? Como é que se vive neste mundo, sem todas estas coisas que inventámos?

Como bem sabemos, o que nos protege, não são as paredes nem as muralhas que construímos. Porque aliás, elas, não nos protegem uns dos outros, nem de nós próprios.

O que nos protege, é a forma como vivemos.

Não são as nossas ideias ou crenças limitativas, estudos ou notícias, sistemas políticos e económicos ou edifícios de betão, cimento e aço. A vida, acontece na mesma sem tudo isso.

Por esta altura, já temos provas científicas, filosóficas e experiências pessoais suficientes que nos provam que, de facto, a vida em si não tem problema algum, muito pelo contrário, é extremamente inteligente e sabe muito bem como funcionar.

Portanto, faz cada vez menos sentido interferirmos nela, como se fôssemos um observador exterior e não um dos seres que fazem de si parte.

Aristóteles morreu há mais de 2 mil anos, mas as ideias dele ainda permanecem bem vivas em muitos de nós. E está na altura de as deixarmos ir. Só assim, é que nos podemos salvar neste momento.

No fim de contas a vida não é só para observar, é para ser vivida – com equilíbrio, respeito e sustentabilidade.

Vamos viver.

guest
0 Comments
Oldest
Newest Most Voted
Inline Feedbacks
View all comments